quarta-feira, 30 de março de 2011

É a Amazônia, estúpido!

Os interesses imperialistas estão sobre o Brasil. Nesse caso, com o envio de seu principal representante ao País, Barack Obama.
Por Atilio Borón
Todos recordam aquela frase com a qual Bill Clinton desarmou George Bush pai na competição presidencial de 1992. Uma expressão parecida poderia ser utilizada no momento atual, quando muitos pensam, no Brasil e no exterior, que Obama está de visita a esse país para vender os F-16 fabricados nos Estados Unidos, neutralizando seu competidor francês e para promover a participação de empresas estadunidenses na grande expansão futura do negócio petroleiro brasileiro.
Também, para assegurar um subministro confiável e previsível à sua insaciável demanda de combustível mediante acordos com um país do âmbito hemisférico e menos conflitivo e instável do que seus provedores tradicionais do Oriente Médio ou da própria América Latina. Além disso, a pasta de negócios que Obama leva inclui a intervenção de empresas de seu país na renovação da infraestrutura de transportes e comunicações do Brasil e nos serviços de vigilância e de segurança requeridos pela Copa do Mundo de Futebol (2014) e dos Jogos Olímpicos (2016).
Os que apontam essas realidades não deixam de assinalar os problemas bilaterais que afetam a relação comercial, sobretudo devido à persistência do protecionismo estadunidense e as travas que isso implica para as exportações brasileiras. A relação, portanto, está longe de ser tão harmoniosa como muitos dizem. Além disso, a crescente gravitação regional e, em parte, internacional do Brasil é vista com preocupação por Washington. Sem o apoio do Brasil e da Argentina, e também de outros países, a iniciativa bolivariana de acabar com a Alca não teria prosperado. Portanto, um Brasil poderoso é um estorvo para os projetos do imperialismo na região.
Dado o anterior, temos que perguntar-nos sobre os objetivos da visita de Obama ao Brasil. Observemos primeiro os dados do contexto: desde o começo do governo de Dilma Rousseff, a Casa Branca desatou uma enérgica ofensiva tendente a fortalecer a relação bilateral. Não haviam passado dez dias de sua instalação no Palácio do Planalto quando recebeu a visita dos senadores republicanos John McCain e John Barrasso; poucas semanas mais tarde seria o Secretário do Tesouro, Timothy Geithner, que bateria à sua porta para reunir-se com a presidente.
O interesse dos visitantes se desatou ante a mudança presidencial e o sinal esperançoso procedente de Brasília, quando a presidente anunciou que estava reconsiderando a compra de 36 aviões de combate da firma francesa Dassault, anunciada por Lula antes do fim de seu mandato. Essa mudança de atitude fez com que os lobbistas das grandes empresas do complexo militar-industrial – isto é, do "governo permanente" dos Estados Unidos, independentemente do ocupante transitório da Casa Branca -  deixaram-se cair sobre Brasília com a esperança de ver-se beneficiados com a adjudicação de um primeiro contrato por 6 bilhões de dólares que, eventualmente, poderia crescer significativamente se o governo brasileiro decidisse, como se espera, ordenar a compra de outros 120 aviões nos próximos anos. Porém, seria um erro acreditar que somente a motivação crematística é a que inspira a viagem de Obama.
Na realidade, o que a ele mais interessa em sua qualidade de administrador do império, é avançar no controle da Amazônia. Requisito principal desse projeto é entorpecer, já que não se pode deter, a crescente coordenação e integração política e econômica em curso na região e que tem sido tão importante para fazer naufragar a Alca, em 2005, e frustrar a conspiração secessionista e golpista na Bolívia (2008) e no Equador (2010).
Também deve tentar semear a discórdia entre os governos mais radicais da região (Cuba, Venezuela, Bolívia e Equador) e os governos "progressistas" –principalmente, o Brasil, a Argentina e o Uruguai-, que pugnam por encontrar um espaço, cada vez mais demarcado e problemático, entre a capitulação aos ditames do império e os ideais emancipatórios, hoje encarnados nos países da Alba, que há 200 anos inspiraram as lutas pela independência de nossos países.
O resto são assuntos secundários. Após esses antecedentes, surpreende a indecisão de Rousseff em relação com o reequipamento de suas forças armadas porque se, finalmente, o Brasil chegasse a fechar o trato, favorecendo a aquisição dos F-16 em vez dos Rafale franceses, seu país veria seriamente menoscabada sua vontade de reafirmar sua efetiva soberania sobre a Amazônia.
Com isso não quero afirmar que o Brasil deve comprar os aviões da Dassault; mas que qualquer outra alternativa é preferível à alternativa do provedor estadunidense. Se tal coisa chegasse a acontecer é porque a chancelaria brasileira teria passado por alto, com irresponsável negligência, o fato de que no tabuleiro geopolítico hemisférico Washington tem dois objetivos estratégicos: o primeiro, mais imediato, é acabar com o governo de Hugo Chávez, apelando para qualquer expediente, seja de caráter legal e institucional ou por qualquer forma de sedição. Esse é o objetivo manifesto e vociferado da Casa Branca.
O fundamental, porém, em longo prazo, é o controle da Amazônia, lugar onde se depositam enormes riquezas que o império, em sua desorbitada carreira para a apropriação excludente dos recursos naturais do planeta, deseja assegurar para si sem ninguém que se intrometa no que sua classe dominante percebe como sua região natural: água, minérios estratégicos, petróleo, gás, biodiversidade e alimentos. Para os mais ousados estrategistas estadunidenses, a bacia amazônica, da mesma forma como a Antártida, é uma área de livre acesso, onde não se reconhecem soberanias nacionais, e, por isso mesmo, aberta aos que contem com "os recursos tecnológicos e logísticos" que permitam sua exploração adequada. Isto é: os Estados Unidos.
Porém, obviamente, nenhum alto funcionário do Departamento de Estado ou do Pentágono, e muito menos o presidente dos Estados Unidos, anda dizendo essas coisas em voz alta. Mas, atuam em função dessa convicção. E, coerente com essa realidade, seria insensato para o Brasil apostar em um equipamento e em uma tecnologia militar que o colocaria em uma situação de subordinação ante quem ostensivamente está disputando a posse efetiva dos imensos recursos da Amazônia. Ou alguém tem dúvidas de que, quando chegue o momento, os Estados Unidos não vacilarão um segundo em apelar à força para defender seus vitais interesses ameaçados pela impossibilidade de ter acesso aos recursos naturais situados nessa região?
Por conseguinte, o que está em jogo é precisamente o controle dessa zona. Obviamente, sobre isso Obama não intercambiará uma palavra com sua anfitriã. Entre outras coisas porque Washington já exerce certo controle de fato sobre a Amazônia a partir de sua enorme superioridade em matéria de comunicação via satélite. Além disso, a extensa cadeia de bases militares com a qual os Estados Unidos têm rodeado essa área ratifica, com os métodos tradicionais do imperialismo, essa inocultável ambição de apropriação territorial.
A preocupação que moveu o ex-presidente Lula da Silva ao acelerar o reequipamento das forças armadas brasileiras foi a inesperada reativação da IV Frota dos Estados Unidos poucas semanas depois que Brasília anunciou o descobrimento de uma enorme jazida de petróleo submarino em frente ao litoral paulista. Nisso, tornou-se evidente, como um pesadelo, que Washington considerava inaceitável um Brasil que, além de contar com um grande território e uma riquíssima dotação de recursos naturais, pudesse também converter-se em uma potência petroleira e, por isso mesmo, em um país capaz de contrabalançar o predomínio estadunidense ao sul do Rio Bravo e, em menor medida, no tabuleiro geopolítico mundial.
O astuto minueto cortesano da diplomacia estadunidense tem ocultado os verdadeiros interesses de um império sedento de matérias primas, de energia e de recursos naturais de todo tipo e sobre o qual a grande bacia amazônica exerce uma irresistível atração. Para dissimular suas intenções, Washington tem utilizado –com êxito, porque a bacia amazônica acabou sendo rodeada por bases estadunidenses- um sutil operativo de distração no qual o Itamaraty caiu como um novato: oferecer seu apoio para conseguir que o Brasil obtenha um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU.
É difícil entender como os experimentados diplomatas brasileiros levaram a sério tão inverossímil oferecimento, que franqueava o ingresso ao Brasil, enquanto o fechava a países como Alemanha, Japão, Itália, Canadá, Índia e Paquistão. Deslumbrados por essa promessa, a chancelaria brasileira e o alto mando militar não perceberam que, enquanto se entretinham em estéreis divagações sobre o assunto, a Casa Branca ia instalando suas bases por onde quis: sete na Colômbia, no quadrante noroeste da Amazônia; duas no Paraguai, no sul; pelo menos uma no Peru, para controlar o acesso oeste à região e uma, em trâmite, com a França de Sarkozy, para instalar tropas e equipamentos militares na Guiana Francesa, aptos para monitorar a região oriental da Amazônia. Mais ao norte, bases em Aruba, Curaçao, Panamá, Honduras, El Salvador, Porto Rico, Guantanamo, para fustigar a Venezuela bolivariana e à revolução cubana.
Pretender reafirmar a soberania brasileira nessa região apelando para equipes, armamentos e tecnologia bélica dos Estados Unidos constitui um maiúsculo erro, pois a dependência tecnológica e militar que isso implicaria deixaria o Brasil atado de pés e mãos aos desígnios da potência imperial. Está claro que os interesses nacionais do Brasil e dos Estados Unidos são coincidentes. Alguns assim acreditam; porém, seria gravíssimo que a presidente Dilma Rousseff incorra em tão enorme e irreparável erro de avaliação. E os custos – econômicos, sociais e políticos - que o Brasil e, com ele, toda a região, deveriam pagar devido a tal desatino seriam exorbitantes.

terça-feira, 29 de março de 2011

Manifestações de professores continuam sendo repreendidas por policiais e militares

Karol Assunção

Jornalista da Adital

Repressão policial. Essa é a resposta dada às manifestações de alunos e professores hondurenhos que lutam contra a privatização da educação pública em Honduras. As mobilizações deste mês já resultaram na morte de uma professora, em dezenas de feridos e em pelo menos 20 educadores/as presos/as. A manhã de hoje (28) foi marcada por nova onda de violência. Desta vez contra o povo garífuna, que realizava ações em apoio às manifestações dos professores e da população hondurenha em resistência.
Os protestos do povo garífuna também não saíram imunes à violência policial. Informações indicam que, na manhã de hoje, policiais desalojaram violentamente as mobilizações pacíficas que a população realizava contra a repressão cometida contra professores e hondurenhos em resistência. Além de apoiar as manifestações hondurenhas, os garífuna ainda pediam respeito aos territórios ancestrais e à comunidade de Triunfo de la Cruz.
A ação policial de hoje resultou na agressão e detenção de Miriam Miranda, identificada como líder garífuna. De acordo com notícias de defensoresenlinea.com, Miriam está em uma cela policial em Tela, no departamento de Atlântida.
Já faz mais de três semanas que docentes e policias hondurenhos se enfrentam em manifestações pelo respeito aos direitos dos/as professores/as e contra a privatização da educação pública. Na sexta-feira passada (25), uma decisão judicial enviou 20 professores para as prisões hondurenhas. Os 15 professores detidos foram para a Penitenciária Nacional enquanto que as cinco professoras foram para o Cárcere de Mulheres.
Os/as 20 docentes foram acusados de delitos por participação em manifestações ilícitas e, segundo informações de defensoresenlinea.com, o juiz responsável pelo caso "nem sequer abriu os envelopes que continham a informação documental sobre as situações dos/as imputados/as, mas que se limitou a dar por certo o que a polícia e a promotoria apontaram como delitos Associação Ilícita, Danos à Propriedade, Sedição, sem ter provas contundentes”.
A expectativa é que amanhã (29) aconteça uma audiência inicial na qual o juiz – que já foi acusado de parcialidade – anuncie a decisão de libertar ou não os/as docentes detidos/as.
Esses não foram os únicos casos de repressão ocorridos durante as manifestações dos profissionais da educação. Na semana passada, policiais entraram na Universidade Nacional Autônoma de Honduras (Unah) e lançaram bombas lacrimogêneas contra professores, estudantes, trabalhadores e familiares de alunos que estavam no local.
Em resposta, os atingidos jogaram garrafas e pedras para se defender dos ataques cometidos por policiais e militares que estavam de rostos cobertos. A ação resultou em 36 pessoas feridas e na detenção do estudante Gilberto Valladares.
No último dia 18, uma repressão parecida interrompeu a vida da professora Ilse Ivania Velásquez, quem, após ser atingida por uma bomba lacrimogênea, caiu no chão e foi atropelada por carro que tentava sair do confronto e não viu a docente por conta da nuvem de gás. O episódio aconteceu durante a ação policial contra manifestações de docentes nas proximidades do Instituto de Previsão de Magistério (Inprema).
Com informações de Defensoresenlinea.com, Resistencia Honduras e Kaos en la Red.

segunda-feira, 28 de março de 2011

Manifestação Artística

A SOCIEDADE
Que coisa é essa que digo não, mas aceito de alma e coração. Finjo não ver só para não aborrecer. Luto para ser e ter. Vivendo em comunidade pensando no que é meu. Não sei mais o que eu quero e o que sou, estou sendo só mais um no meio disso tudo, esperando algo em que acreditar e enfrentar. Estão dizendo por ai o que eu devo fazer, ser, ler e ver, mas o que eu quero é viver.
Produz mas não consome.
Estuda mas não aprende.
Medica-se e fica cada vez mais doente.
Reza mas nada muda.
Planeja-se, mas não se coloca em prática.
Estuda-se muito e evolui-se pouco.
Questiona a realidade, mas se conforma com os problemas.
Guarda dinheiro e sempre deve.
Sempre compra coisa mais sempre esta faltando algo.
Luta para adquirir algo e quando o tem, quer trocar.
Buscam lazer e o que acha é acidentes, ressacas e futilidade.
Tenta ser popular, mas não tem amigos.
Pede por democracia, mas se contenta por votar a cada dois anos.
Fala de corrupção, mas não perde a oportunidade quando à surge.
Fala de organização, mas é a desorganização que sustenta sua teoria.
Bebe pra se divertir, mas depois não se lembra do que fez.
Busca paz interior, mas não vê que a paz depende do convívio entre as pessoas.
Luta por felicidade, mas não tem noção do que seja.
Tem conhecimento dos piores problemas do mundo, mas nada faz.
Utiliza de vários meios de comunicação, mas é alienado.
Diz-se solidário, mas utiliza do natal para esvaziar o armário.
Diz que Deus é um só mais repudia da religião do outro.
Luta pela liberdade de expressão, mas não a utiliza.
Luta pelo desenvolvimento sustentável, mas não abre mão do consumo desnecessário.
Diz que ama, mas trai quando pode.
E a lista segue...segue... na esperança do impossível, da busca de motivo, na paz nunca atingida, na dor sempre constante, mas além da espera na esperança da mudança! 

sábado, 26 de março de 2011

Hoje é Sábado! Dia de Bate Papo!



18 de março de 2011

“O trabalho escravo contemporâneo no Brasil tem sido principalmente detectado e combatido em atividades rurais”. Assim Xavier Plassat descreve a situação de um dos grandes problemas do país: o trabalho escravo. Na entrevista a seguir, realizada por email, ele fala da saída da empresa Cosan da lista suja, um cadastro público produzido pelo Ministério do Trabalho de empresas acusadas de submeter trabalhadores a situações análogas à escravidão. “No caso da Cosan, o que acontece é que o advogado do governo está renunciando a defender seu cliente, acordando por escrito com a Cosan que a União deixará de apelar contra a última decisão da justiça em favor da desta e não buscará, portanto, reincluir seu nome na lista suja”, explicou.

A Cosan é uma das maiores produtoras e exportadoras de açúcar e etanol do mundo, e a maior produtora de energia elétrica a partir do bagaço da cana-de-açúcar. Em fevereiro deste ano, a empresa se uniu a Shell e, juntas, criaram a Raízen que será a marca corporativa dos negócios e a aposta para o crescimento das vendas internacionais de etanol. No entanto, a Cosan havia sido incluída no cadastro de empregadores flagrados com mão-de-obra escrava em dezembro de 2009 por conta da libertação de 42 pessoas em sua usina em Igarapava-SP.

Nascido na França, Frei Jean Marie Xavier Plassat é coordenador da Campanha contra o Trabalho Escravo e destaca-se pela sua atuação na Comissão Pastoral da Terra (CPT) e na luta contra o trabalho escravo contemporâneo no Brasil. Seu trabalho rendeu-lhe o Prêmio Nacional de Direitos Humanos em 2008. É graduado em Ciência Política em Paris em 1970, ingressou na ordem dominicana no ano seguinte.
Confira a entrevista.

IHU On-Line – Depois de fazer um acordo com o governo federal, o nome da Cosan não consta mais na chamada "lista suja" do Ministério do Trabalho. Qual sua avaliação deste acordo? Ele abre brecha para a continuidade do trabalho escravo no Brasil?

Frei Xavier Plassat – 
É preciso voltar um pouco antes deste acordo. Os fatos caracterizando o trabalho análogo ao de escravo resultam de uma fiscalização de 2007 na Usina Junqueira, do grupo Cosan, em Igarapava-SP. Na oportunidade foram resgatados 42 cortadores de cana aliciados em Pernambuco por um gato camuflado de empresa terceirizada de corte de cana. Esgotados os recursos disponíveis contra os autos da fiscalização, o nome da Cosan foi para o Cadastro de Empregadores da Portaria nº 540/04 do Ministério do Trabalho (vulgo: “lista suja”). Bem antes de qualquer conversa com o governo federal, a Cosan já conseguiu na Justiça do Trabalho uma decisão liminar – concedida pelo juiz substituto Raul Gualberto Fernandes Kasper de Amorim, do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (TRT-10) posteriormente confirmada por sentença de 1ª instância , retirando seu nome da Lista suja: este é o expediente regularmente procurado por outros empregadores na mesma situação. Eles têm esse direito e há juízes para atendê-los prontamente, mesmo se para isso se utilizam de argumentos impróprios, demonstrando frequentemente seu grave desconhecimento em relação ao que a lei brasileira considera como trabalho análogo ao de escravo. 

Geralmente, esses argumentos não resistem aos recursos interpostos e apreciados nas instâncias superiores. É dever do Advogado do Governo, que é a Advocacia Geral da União, defender judicialmente os atos do Executivo: portanto cabe ao Advogado Geral da União recorrer de tais decisões até a última instância. No caso da Cosan, o que acontece é que o advogado do governo está renunciando a defender seu cliente, acordando por escrito com a Cosan que a União deixará de apelar contra a última decisão da justiça em favor desta e não buscará, portanto, reincluir seu nome na "lista suja". É uma situação para lá de bizarra: inédita e escandalosa. Como para dizer: “ao agronegócio tudo é permitido” ou ainda: “o Ministério responsável pela publicação da lista suja – que é o Ministério do Trabalho – agiu de forma equivocada e não dá para defendê-lo”. Essa postura (a de desqualificar a atuação do Ministério do Trabalho e Emprego – TEM) já havia sido adotada pelo então ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, cuja pasta é mesmo a de advocacia geral do agronegócio brasileiro (ele chegou a qualificar a inclusão da Cosan na "lista suja" de "exagero" e de "erro"). A presidente daConfederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA, senadora Kátia Abreu, é mais radical: “Agentes partidários, travestidos de funcionários públicos, empenham-se em difundir a infâmia de que a maioria dos produtores rurais ou é predadora do meio ambiente ou escravagista. A manipulação de causas contra as quais ninguém, na essência, se opõe é um dos truques de que se vale uma certa esquerda fundamentalista, adversária da livre-iniciativa, para manter como reféns os produtores rurais, difamando-os” (O Estado de São Paulo, 25-5-2010).

Bizarro e escandaloso: porque há provas caracterizando como “análoga à de escravo” a situação encontrada pelos fiscais em junho de 2007 na Usina da Cosan (usina Junqueira, em Igarapava-SP). Trata-se do relatório do Grupo Móvel de Fiscalização onde são reunidas as evidências coletadas pelos Auditores Fiscais do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e a Polícia Federal presentes na operação. Mesmo assim, na sua decisão o magistrado sustentou que os autos de infração eram insuficientes para a "tipificação da redução à condição análoga à de escravo". E ainda argumentou que, por ter assinado – três meses antes do caso em tela – um Termo de Ajustamento de Conduta com o MPT (TAC nº 2803/2006), em consequência de uma fiscalização anterior, a Cosan não podia ser questionada por procedimentos que já havia se comprometido a resolver... entre os quais justamente o uso da terceirização ilegal.

"Bizarro e escandaloso: porque há provas caracterizando como “análoga à de escravo” a situação encontrada pelos fiscais em junho de 2007 na Usina da Cosan"

O que impressiona e desola ao mesmo tempo é ver que um Advogado Geral da União, por tarefa, eminente sabedor das leis, venha se utilizar dos mesmos argumentos falhos: segundo a reportagem deJoão Carlos Magalhães, publicada na Folha de São Paulo (28-2-2011), o ministro Adams afirma que só fez acordo para resolver uma situação “excepcional”: pois há “fatores que indicam a não intencionalidade” da Cosan em submeter os trabalhadores a tratamento análogo à escravidão, e mais: não foi nem ela que infligiu esse tratamento, foi um terceiro: a tal empresa terceirizada! Ora justamente esta é estratégia mais comum na prática contemporânea do trabalho escravo: o responsável pela atividade-fim contrata os serviços de terceirizados, imaginando eximir-se da responsabilidade de empregador. É jurisprudência constante a requalificação deste truque: porque no direito brasileiro do trabalho, o que predomina é a realidade da relação, não a sua roupagem legal. Tanto é que já se perdeu a conta dos fazendeiros obrigados a pagar pelas falcatruas do gato por eles interposto, das siderúrgicas intimadas a assumir as contas dos seus carvoeiros de fachada, e das usinas responsabilizadas por terceirização ilegal.

Mas tem outro "detalhe", provavelmente determinante no caso da Cosan: a mesma empresa já havia assinado pactos de responsabilidade empresarial: entre estes o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar. Inclusive, no comunicado público sobre o episódio, a companhia assume para si o "papel de liderança, junto aos governos estadual e federal, no esforço de regulamentar e melhorar as condições de trabalho de toda a cadeia produtiva do agronegócio". No intuito de promover a imagem limpa do produto brasileiro, esse compromisso foi laboriosamente articulado pelo governo federal, na busca frenética de conferir ao etanol o status de commodity global. Este é um compromisso do tipo amistoso: basta assinar que ninguém cobra nada, ninguém monitora, ninguém é sancionado. Você, por encantamento, vira ficha limpa. No ano passado, a própria Comissão Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo – Conatrae chamou para discutir esta bizarrice um representante da Presidência da República. Foi prometida a iminente elaboração de mecanismo de monitoramento independente.

Até hoje esperamos... Entendo assim: ficava realmente muito feio na fotografia ter a mesma empresa ao mesmo tempo incluída na lista suja e presumida “liderança” da lista limpa. A solução imaginada foi a de quebrar um dos dois termômetros. Ao descartar a possibilidade de a Cosan voltar a frequentar o cadastro do Ministério do Trabalho, o Advogado Geral da União (Luis Inácio), cumprindo ordens recebidas de cima (...), acabou provocando uma deflagração que promete de ir longe. Se oCompromisso da Cana já era considerado um duvidoso instrumento de marketing, agora virou um has been. Já era. A comunidade internacional, a ONU, a OIT costumavam louvar a corajosa política de erradicação do trabalho escravo adotada no Brasil, embasada em avançado conceito legal, alicerçada na independência e no rigor da fiscalização, e amparada por intensa mobilização social e institucional. Já era. Se tal bizarrice foi concedida à Cosan, por que seria recusada a outra qualquer empresa de renome ou de peso ou de boa contribuição eleitoral? Quem pode garantir  como insistiu o ministro Adams  que o governo não virará um "balcão de TACs".

IHU On-Line – O senhor sabe dizer como a Cosan trata seus funcionários? Quais os indícios de trabalho escravo?

Frei Xavier Plassat – 
A fiscalização realizada na Usina Junqueira trouxe evidências robustas. Segundo a procuradora do trabalho, Carina Rodrigues Bicalho, que atuou na fiscalização da Cosan, as constatações do Grupo Móvel foram plenamente suficientes para caracterizar o trabalho análogo ao de escravo. 

São assim resumidas pelo jornalista Maurício Hashizume, da Repórter Brasil (10-1-2010): Aliciamento de trabalhadores, submissão a sistema de endividamento (conhecido também como "barracão" ou “truck system”); condições degradantes e irregulares nas frentes de trabalho e em termos de alojamento, alimentação, transporte etc. Um preposto da  empresa terceirizada José Luiz Bispo Colheita - ME arregimentou mão de obra em 
Araripina-PE. De lá, mobilizou transporte irregular – sem a Certidão Declaratória exigida pelo MTE – até Delta-MG, na divisa entre SP e MG, próximo a Igarapava-SP. A viagem foi cobrada antecipadamente (R$ 210). As vítimas contaram que, no momento da abordagem inicial, não foram informadas que teriam de arcar com aluguel, comida e produtos de necessidade básica para o trabalho. Quando chegaram ao precário "Alojamento do Guri", em Delta-MG, as vítimas se viram obrigadas a pagar pela estadia. Alimentos e outros itens essenciais (chapéu de proteção contra o sol, marmita para refeições e garrafa térmica para levar água) adquiridos nos supermercados do Carlinhos e do Juarez, indicados pelo intermediário na contratação; eram contabilizados como dívidas e acabavam sendo descontados dos salários. "Não estava sobrando dinheiro para que eles pudessem mandar para a família", sublinhou a procuradora.

A maior parte do grupo começou a trabalhar em maio de 2007 e a fiscalização recolheu "vales" correspondentes aos produtos contabilizados no sistema de dívidas. Entre os libertados da Usina Junqueira, havia um jovem de 17 anos trabalhando no corte de cana, atividade proibida para quem não tem 18 anos completos. No Alojamento do Guri, foram constatadas outras irregularidades tais como excesso de pessoas, alimentos próximos a EPIs e ferramentas sujas e dispostos no chão, carnes penduradas em varais pelos cômodos, instalações sanitárias sem condições de uso e fiação elétrica inadequada. Havia ainda problemas graves nas frentes de trabalho como a ausência de água potável e o transporte irregular. A água que os trabalhadores levavam para beber era retirada diretamente das torneiras do Alojamento do Guri, sem passar por qualquer filtragem ou purificação. Sem documentação regular e em péssimo estado de conservação, o ônibus que levava o grupo estava sem freio e foi apreendido pela fiscalização. 
IHU On-Line – O que caracteriza o trabalho escravo na modernidade? A que situações e condições de trabalho as pessoas são submetidos?

Frei Xavier Plassat – 
No Brasil, além de referido aos compromissos internacionais assumidos pelo país junto à ONU, à OIT e à OEA, o trabalho escravo é definido por lei interna, incorporada ao Código Penal (artigo 149). Essa lei não pode ser acusada de ser defasada: ela foi reformulada pelo Congresso Nacional em 2003 (Lei 010.803-2003). Na redação anterior, o legislador só aludia ao crime de trabalho análogo ao de escravo e definia as penas incorridas (2 a 8 anos de reclusão). Como consequência, vários intérpretes da lei procurava na escravidão antiga, colonial ou imperial, o modelo de referência: grilhões, castigos, correntes. Na nova redação, o legislador enumera as hipóteses em que esse crime é configurado e se atenta às modernas correntes da escravidão: trabalho forçado, dívida, coação da liberdade, degradância da pessoa, jornada exaustiva. Eis as características destacadas.

No texto atual, é crime “reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. § 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.” É interessante ver que também, na legislação internacional moderna sobre servidão e escravidão, estão cada vez mais incorporados esses critérios centrados simultaneamente na dignidade e na liberdade da pessoa, porque – e isto é uma evidência   não há como garantir esta sem aquela.

IHU On-Line – O senhor percebe, no país, uma tentativa de desmoralizar a fiscalização do trabalho escravo? Como vê a fiscalização nesta área?

Frei Xavier Plassat –
 Especialmente quando se interessa a grandes empreendimentos do agronegócio brasileiro, 
a fiscalização do Ministério do Trabalho é alvo de ataques coordenados: Unaí-MG foi o mais cruel (3 fiscais e seu motorista foram chacinados quando fiscalizavam lavouras de feijão); Confresa-MT e Ulianópolis-PA foram os mais “políticos” (senadores e representantes classistas, tentaram tumultuar o resgate de, respectivamente, 1108 e 1064 cortadores de cana na Gameleira e na Pagrisa). O caso Cosan abre novo capítulo nessa história.

Embora sujeita às imprevisíveis contingências orçamentárias, deve-se reconhecer que o Brasil tem na fiscalização do trabalho um instrumento de que poucos países dispõem. O Grupo Móvel de fiscalização opera desde 1995, mas a largada de verdade foi dada a partir de 2003, conseguindo-se libertar de lá para cá mais de 35 mil trabalhadores, 85% do total resgatado desde 1995. Não é que tudo funciona a contento: há problemas tais como o engessamento do planejamento gerando atrasos no atendimento a denúncias que, se não tratadas com urgência, perderão consistência; há dificuldades operacionais para garantir efetiva participação da Polícia Federal com sua competência específica de polícia judiciária; há resistência em algumas superintendências regionais para assumir esse tipo de fiscalização.
Mas, no geral, pode-se dizer que a fiscalização melhorou em termos de atendimento. Já é menor a proporção de denúncias (um terço) que continuam sem fiscalização. Mas, importante que seja lembrado, a fiscalização é só um passo inicial no combate ao TE: passo indispensável mas insuficiente. Libertar 100 escravos, 1000 escravos ou 40.000, como aconteceu desde 1995, não erradica a escravidão. Ela é um sistema que tem raízes profundas e mecanismos eficazes para garantir sua reprodução: ganância, miséria, impunidade, um ciclo onde cada elemento é produtor e gerador dos demais.

IHU On-Line – Que órgão é responsável pela fiscalização?

Frei Xavier Plassat –
 A fiscalização móvel, que é a fiscalização especializada no combate ao trabalho escravo, é competência do Ministério do Trabalho o qual articula as operações do Grupo de Fiscalização Móvel, um grupo especial, com comando central independente das pressões locais ou regionais. Em função das competências locais disponíveis e do caráter das denúncias investigadas, um número significativo de operações acaba sendo assumido por Grupos de Fiscalização constituídos nas próprias Superintendências Regionais do Trabalho, mas obedecendo aos mesmos critérios operacionais.

IHU On-Line – Como atua a Comissão Nacional/Estadual de Erradicação do Trabalho Escravo?

Frei Xavier Plassat –
 Sob a presidência do ministro-chefe da Secretaria de Direitos Humanos, a Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae) é formada por representantes do executivo, por meio de vários ministérios (Trabalho e Emprego, Justiça, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Fazenda Desenvolvimento Social, etc.), representantes de entidades (sociedade civil: Comisão Pastoral da Terra, Repórter Brasil, Movimento Humanos Direitos, Organização Internacional do Trabalho, Ministério Público, associações de magistrados, procuradores), inclusive entidades sindicais patronais (CNA, CNI) e de trabalhadores (Contag).
Cabe à Conatrae acompanhar a execução das políticas e fomentar ações e articulações de que a conjuntura necessita. Deveria ser por excelência um espaço de monitoramento e adaptação das ações do plano. A partir de 2006, como resultado da mobilização social, começaram a ser criadas algumas Coetrae (ou equivalente), em nível estadual, com a mesma finalidade, relacionada à implementação de planos estaduais específicos: assim foi no Maranhão, Tocantins, Mato Grosso, Piauí e, mais recentemente, na Bahia. Rio de Janeiro e São Paulo estão em processo de criação. A bem da verdade, muitas ficaram ainda no papel, destacando-se positivamente algumas iniciativas em Mato Grosso e Piauí, e algumas tentativas no Tocantins.

IHU On-Line – Como se descobrem os casos de trabalho escravo? Os trabalhadores têm o hábito de denunciar?

Frei Xavier Plassat –
 A denúncia dos próprios trabalhadores é o principal canal para descobrir os casos de trabalho escravo e orientar a fiscalização. Para um trabalhador submetido a tal situação, a decisão de fugir para denunciar não é ato qualquer: é ato de resistência e de risco assumido que só vem acontecendo quando um limite é ultrapassado na violação de sua dignidade ou de sua liberdade. Como muitos acabam resumindo, o limite é quando se acham “tratados pior que animais” e que se rompem as amarras que os prendiam ainda à cultura ou à norma da obediência, da promessa feita, da dívida a pagar (“peão paga o que deve”).

Com a divulgação do tema, sua maior exposição na mídia, a consciência de que denunciar pode provocar resposta efetiva, a decisão de partir para a denúncia tem virado menos problemática. Por muito tempo as equipes da Comissão Pastoral da Terra – CPT foram o canal principal de recepção e encaminhamento das denúncias desses trabalhadores. Isso reflete provavelmente a credibilidade do trabalho desenvolvido junto às comunidades rurais nos 35 anos de presença solidária da CPT ao seu lado. Hoje ainda, sua campanha nacional acolhe e identifica mais do terço dos casos. Acolher um trabalhador implica em muito mais que documentar e encaminhar sua denúncia para o Grupo Móvel: redunda em ações pré- e pós-fiscalização: na prevenção e no exercício coletivo da vigilância, na busca de alternativas para que o ciclo da escravização não volte a se reproduzir. Caso contrário, se devolvido às mesmas condições que provocaram seu aliciamento, o trabalhador resgatado terá séria probabilidade de voltar qualquer dia à situação análoga à de escravo.

IHU On-Line – Em que setores industriais brasileiros há maior evidência de trabalho escravo?
Frei Xavier Plassat – O trabalho escravo contemporâneo no Brasil tem sido principalmente detectado e combatido em atividades rurais. Mesmo assim, sabemos que é uma realidade urbana também, principalmente em oficinas de confecção de São Paulo, onde predomina a exploração de imigrantes bolivianos, geralmente irregulares ou traficados. Em 2010, 242 pessoas foram libertadas de situação análoga à de escravo em atividades não agrícolas: construção civil (175, inclusive em obras... do PAC), entretenimento (24), confecção (43) e foram 25 os casos registrados de um total nacional de 211. No campo dois terços dos casos identificados entre 2003 e 2010 estão na pecuária em sentido amplo (desmatamento, abertura e manutenção de pasto); 17% em lavouras de soja, algodão, café, milho, plantações de cana de açúcar, culturas de frutas e legumes, reflorestamento; 10% em carvoarias a serviço da siderurgia (o carvão vegetal é insumo para a produção de ferro-gusa, insumo do aço). Em termos de pessoas resgatadas (na conta da CPT: 35.027 entre 2003 e 2010), a pecuária representa 35%, a cana: 29%, as outras lavouras e o reflorestamento: 20% e o carvão vegetal: 7%. 

IHU On-Line – O trabalho escravo é acentuado em alguma região específica do país? Quais os estados que ainda permitem essa prática?

Frei Xavier Plassat –
 No início, detectado essencialmente no chamado arco do desmatamento – que vai do Maranhão até Mato Grosso passando por Pará e Tocantins –, houve uma extensão do fenômeno à totalidade do território nacional, com pouquíssimas exceções. Mesmo assim a Amazônia respondeu por dois terços dos casos em 2009 e 2010 (sendo 47% no Norte e 35% somente no Pará) e um terço dos resgates (23% no Norte); Sudeste e Sul por 12 e 10% respectivamente (mas 63% e 11% dos resgates, resultado em que influi o efeito “canavial”: a mão de obra concentrada num só canavial ultrapassa e muito o número de trabalhadores explorados em uma fazenda de gado); 15 a 18% dos casos e dos resgates estão no Centro-Oeste (em parte inserido na Amazônia). 

De 2003 a 2010, o Sul registrou 85 casos sendo 47 no Paraná, 26 em Santa Catarina e 12 no Rio Grande do Sul. Longe ainda dos “campeões”: Pará (901 casos), Maranhão (218), Tocantins (208), Mato Grosso (195), Goiás (84), Bahia (56). Perto de Minas Gerais (48), Mato Grosso do Sul (38), Rio de janeiro (27), São Paulo (24), Piauí, Rondônia e Espírito Santo (20 cada). Pelo número de resgatados, eis os estados mais críticos: Pará (8973), Mato Grosso (4026), Goiás (3070), Tocantins (2400), Mato grosso do Sul (1969), Maranhão (1967), Minas Gerais (1846), Rio de janeiro (1680), Espírito Santo (968). 

IHU On-Line – Como explicar que ainda exista trabalho escravo no século XXI?

Frei Xavier Plassat –
 Essa questão do “ainda” é complexa e simples ao mesmo tempo: lucrar é a razão derradeira que move o escravagista, não a maldade em si. Esse motor é cego, tanto é que, se flagrado, o escravagista moderno “justifica” que nem sabia que aquilo estava acontecendo em suas terras, sob seu comando. Esse motor cego não tem época: somente encontra mais ou menos freios na lei, no Estado, na sociedade.
Trabalho degradante, jornada exaustiva, dívida fabricada, humilhações, ameaças e violência, junto com o isolamento, são as correntes eficazes do moderno cativeiro. Obviamente há diferenças em relação à forma antiga de escravizar. Sobre o escravo moderno, o patrão não exerce como antigamente um direito de propriedade, mas sim de uso e abuso, o que muitas vezes se revela até pior, pois não se responsabiliza pela “conservação” deste patrimônio ou a reprodução de sua prole. Pelo contrário, descarta-o quando não lhe serve mais, depois de explorá-lo até ou além do limite, em serviços braçais necessariamente de limitada duração (a duração média dos serviços “contratados” nessa modalidade não passa geralmente de 3 a 4 meses). Carvoeiro, roçador de pasto ou cortador de cana do século XXI tem expectativa de vida inferior a muitos escravos dos séculos passados.

O trabalho escravo segue o rastro do agronegócio o qual, na última década, se tornou a menina dos olhos das 
políticas públicas: na fumaça das carvoarias que sacrifica homens e florestas para produzir aço; nas pegadas do gado que continua avançando sobre a Amazônia Legal, com desmatamento em grande escala; na onda da lavoura de soja que conquistou os cerrados centrais; no boom do etanol que explode de norte a sul e ressuscita o velho canavial. Presente nas principais cadeias produtivas do agronegócio brasileiro: carne e madeira (metade das denúncias), cana e demais lavouras (metade dos libertados), e carvão vegetal para uso na siderurgia. Operadores internacionais demandam produtos sempre mais baratos sem se preocupar com o que isso implica lá na ponta. Parece haver ligação entre essa expansão desenfreada do agronegócio, no contexto da economia globalizada, e a precarização das relações trabalhistas.

Como costuma dizer Leonardo Sakamoto,“em nome da conquista de novas fatias de mercado, sem redução das margens de lucro, há uma pressão contínua para flexibilizar os direitos do trabalhador”. É fato que aonde o Ministério do Trabalho leva a fiscalização, flagra situações degradantes e identifica trabalho escravo. E aí fica a contradição: é o mesmo Estado que apoia a expansão acelerada das monoculturas de exportação e que corre atrás dos prejuízos brutais que ela própria provoca. Que liberta escravos na Cosan e confere à megaempresa brasileira, líder global do açúcar e do etanol, seu duvidoso atestado de lisura.

IHU On-Line – É possível estimar quantos trabalhadores escravos existem no Brasil atualmente?

Frei Xavier Plassat – 
Não é possível falar um valor certo: nenhum IBGE da vida se arrisca a contabilizar um crime ainda por ser desvelado. O que existe são estimativas “a mínima”: a CPT avançou anos atrás uma hipótese conservadora de pelo menos 25.000 trabalhadores entrando anualmente no ciclo da escravidão, somente na Amazônia. Muitos fiscais do trabalho hoje falam em 40 a 100.000 pessoas, para o conjunto do país. É muito e pouco ao mesmo tempo: significa que só uma fração dos empregadores rurais mantém essa prática criminosa e que seria teoricamente fácil acabar com isso. Para isso já precisaria uma CNA mais responsável. Comparado aos números disponíveis para o mundo (entre 12,5 e 27 milhões de escravos), o Brasil não está entre os piores;  está entre os poucos que adotaram uma política de combate: um modelo que – até este episódio da Cosan – havia virado artigo de exportação, aprovado pela OIT e pela ONU. Sobre a situação mundial, sugiro ao leitor uma visita ao Freedom Project, lançado este mês pela CNN: http://thecnnfreedomproject.blogs.cnn.com. Ali assistirá uma cena impressionante: após ver imagens e ouvir depoimentos de uma brutal clareza, o ministro do trabalho da Índia, país líder em trabalho escravo, teima em negar o óbvio: “No, this is not slavery!”. Um discurso que já ouvimos aqui. Para brasileiro ou para inglês ver?

IHU On-Line – Que aspectos sociais, políticos, econômicos têm favorecido a manutenção do trabalho escravo no Brasil?

Frei Xavier Plassat –
 O Brasil tem na escravidão uma herança maldita que gerou estruturas e atitudes até hoje fincadas nas entranhas do país. São muitos ainda – fazendeiros, parlamentares, magistrados, políticos, advogados (gerais ou particulares) e peões – que consideram normal ou, simplesmente, tradicional ou ainda meramente atrasado esse jeito de se conseguir um trabalho braçal de baixo custo, compatível com as ambições agroexportadoras do país.
Como explicar a frequência com a qual escravos são encontrados em terras de juiz, de deputado, de senador, de advogado, de médico, de cantor, de industrial? Como entender a teimosia dos deputados brasileiros em se negar, há mais de 10 anos, em aprovar uma emenda constitucional que propõe simplesmente retirar a propriedade da terra onde for encontrado escravo? Se a propriedade é sinônimo de poder inquestionável e o latifúndio forma em que qualquer política nacional há de ser moldada, então fica difícil garantir os direitos da dignidade, da liberdade, e o acesso de todos a todos os direitos.

A persistência desta herança maldita do capitalismo brasileiro decorre da força exorbitante da "Casa Grande" nas estruturas do poder. Uma expressão paradigmática é a chamada bancada ruralista do Congresso Nacional. 

IHU On-Line – Qual é o perfil do trabalhador escravo? Tal como nos séculos passado, é ele majoritariamente negro?

Frei Xavier Plassat – 
Hoje, um brasileiro não se torna necessariamente escravo por ser negro. Porém, pela sua persistente marginalização socioeconômica, o afrodescendente continua fornecendo os maiores contingentes. Grilhões e ferros não são mais o meio comum de subjugar a liberdade de outrem: os escravos “da precisão”, trabalhadores sem terra e sem alternativa, vítimas das promessas de aliciadores organizados, migram país afora em busca de sustento a qualquer preço. Usar trabalhadores trazidos de fora sempre tem sido a regra na história mundial da escravidão. Nas condições do Brasil contemporâneo, o avanço da fronteira agrícola sobre as terras da floresta amazônica, mas também do Cerrado central e do Pantanal, tem constituído um apelo muito forte para a migração temporária ou definitiva de trabalhadores empobrecidos do nordeste e do norte do país, devidamente aliciados por mirabolantes promessas.
Rotas e empreendimentos foram se diversificando: escravos encontrados no Paraná foram aliciados em Minas e Bahia para plantar pinus ou extrair erva-mate; já em São Paulo, Rio, Mato Grosso e Goiás, os migrantes da cana encontrados em situações degradantes – uma das condições do trabalho análogo à de escravo, culminando em ocorrências de morte por exaustão – vêm do Piauí, Maranhão ou Alagoas. Na maioria dos casos, é encontrada no Norte e Nordeste, os trabalhadores migraram do interior do nordeste procurando alternativa à falta de terra para plantar ou ali acabaram se fixando. Graças à inclusão dos resgatados no Seguro-desemprego a partir de 2003, temos hoje um perfil do conjunto desses trabalhadores. Segundo os números apurados até outubro de 2009, a maioria é de homens (95,5%); 75% deles nasceram entre Maranhão (28%), Pará, Bahia, Mato Grosso do Sul, Piauí, Minas Gerais, Tocantins ou Pernambuco. Analfabeta: 40%; 4ª série incompleta: 28%; ensino médio completo: 1,8%. Em 2 entre 3 casos, a faixa etária no dia da libertação era de 18 a 34 anos; 3% dos resgatados estavam abaixo de 17 anos.
IHU On-Line – O senhor costuma ter contato com trabalhadores escravos? O que eles relatam e o que os impede de abandonar esta situação?

Frei Xavier Plassat – Costumo sim, é parte do nosso dia a dia. Os trabalhadores que nos procuram são variados. Há peões moradores da região que um dia acabam desistindo de se dobrar às imposições do patrão ou do gato e, eventualmente orientados por colegas ou informações da nossa Campanha, ir atrás de seus direitos. Há muitos peões do trecho, para quem a vida é uma sucessão de empreitadas de fazenda em fazenda, com sucessos e derrotas. O que lhes impede de abandonar essa situação é simplíssimo: a falta de alternativa. Mesmo sabendo dos riscos incorridos muitos voltam à empreitada maldita, porque não têm terra para plantar ou qualificação para oferecer no mercado do trabalho. Cada história é uma história. Reproduzo a seguir as anotações que tomei ao entrevistar dois trabalhadores: o Jucimar e o Romualdo (nomes aqui trocados, por questão de segurança).




sexta-feira, 25 de março de 2011

Agenda Cultural Alternativa



Interação entre as artes celebra o Dia Mundial do Teatro
Programação especial do Café com Teatro homenageia a arte de representar.
 A comemoração do Dia Mundial do Teatro, neste domingo, dia 27 de março, contará com uma programação especial do Café com Teatro, evento de difusão e circulação artística de Foz do Iguaçu. Voltada para a interação entre todas as artes, o encontro irá reunir música, dança, circo, artesanato, literatura, escultura, artes visuais, e, claro, peças teatrais de vários grupos, celebrando o teatro, que é uma das mais antigas e expressivas formas artísticas.
O Dia Mundial do Teatro foi criado em 1961, pelo Instituto Internacional do Teatro (ITI), data da inauguração do Teatro das Nações, em Paris, França. Desde então, atores, dramaturgos, e produtores promovem atividades especiais para comemorar esta que uma das principais formas da criação humana.
Apresentações:
Teatro
Dança
Artesanato
Artes Visuais
Música
Literatura
Circo
Contação de História
Brechó

Data: 27/03/2011
Local: Teatro Barracão [Praça da Bíblia]
Horários: 17:00
Entrada: R$: 2,00

 Feirinha da JK
Data: domingo
Local: Avenida JK, em frente à agência da Caixa Econômica Federal
Horário: 8h às 12h
Entrada: franca

Feirinha da Praça
Data: sábados e domingos
Local: Avenida Rep. Argentina, em frente ao Teatro Barracão
Horário: 8h às 12h
Entrada: franca.

Cine Cataratas Jl Shopping
Rango
Gênero: Animação
 Classificação: Livre
 Legenda: Dublado
 Duração: 1h47min
Horários: Sexta, Sábado, Domingo, Segunda e Terça: 15:00h e 17:20h / Quarta e Quinta: 15:00h, 17:20h, 19:30h e 21:50h

Gnomeu e Julieta (3D)
Gênero: Animação
Classificação: Livre
Legenda: Dublado
Duração: 1h24min
Horários: Diariamente: 14:00h e 15:50h e 19:45h

Esposa de Mentirinha
Gênero: Comédia Romântica
 Classificação: 12 Anos
 Legendado
 Duração: 1h57min
Horários: Diariamente: 16:00h, 19:00h e 21:30h

Atividade Paranormal: Tóquio
Classificação: 12 anos
Gênero: Suspenste/Terror
Legenda: Legendado
Duração: 1h. 32min.
Horários: Diariamente: 15:30h, 17:30h, 19:30h e 21:40h.

Passe Livre
Classificação: 14 anos
Gênero: Comédia
Legenda: Legendado
Duração: 1h. 45min.
Horários: Diariamente: 21:00h.

Animais Unidos Jamais Serão Vencidos (3D)
Classificação: Livre
Gênero: Animação
Legenda: Dublado
Duração: 1h. 36min.
Horários: Diariamente: 17:00h e 19:00h.

Invasão do Mundo - Batalha de Los Angeles
Classificação: 12 anos
Gênero: Ficção
Legenda: Legendado
Duração: 1h. 56min.
Horários: Diariamente: 16:00h, 18:30h e 21:20h.

Cine Boulevard
Bruna Surfistinha
Classificação: 16 anos
Gênero: Drama
Legenda: Nacional
Duração: 1h 50min.
Horários: Diariamente: 17:40h, 20:00h e 22:30h

Deixe-me Entrar
Classificação: 14 anos
Gênero: Suspense
Legenda: Legendado
Duração: 1h 54min.
Horários: Diariamente: 20:10h e 22:30h.

Desconhecido
Classificação: 14 anos
Gênero: Suspense
Legenda: Legendado
Duração: 1h 53min.
Horários: Diariamente: 22:10h.

Sucker Punch - Mundo Surreal
Classificação: 12 anos
Gênero: Drama
Legenda: Legendado
Duração: 1h. 50min.
Horários: Segunda a Sexta: 17:30h, 19:50h e 22:20h / Sábado e Domingo: 15:20h, 17:30h, 19:50h e 22:20h.