terça-feira, 5 de abril de 2011

As fronteiras e a violência: um novo capítulo para uma velha história.

Existe uma preocupação manifesta na sociedade civil em relação aos índices de violência no Brasil e, mais especificamente, nos seus limites internacionais. Neste sentido, a presença de grupos criminosos vinculados ao descaminho de mercadorias e ao tráfico de drogas, armas e pessoas é denunciada e acusada como o grande problema regional. O clima de instabilidade e insegurança que predominaria nas regiões de fronteira derivaria das atividades ilícitas, e contaminaria, como uma espécie de praga, todo o cotidiano da população.
            Sem sombra de dúvidas, tais sensações possuem fundamento. Conforme apresenta o Mapa da Violência do Brasil de 2008, dos dez municípios mais violentos do país três encontram-se em região de fronteira internacional (Foz do Iguaçu/PR, Guairá/PR e Coronel Sapucaia/MS). Não suficiente, entre os anos de 2002 e 2006, os dois primeiros municípios referidos lideraram o ranking de homicídios promovidos por armas de fogo. Todavia, esses indicadores não são isolados, problemas relacionados à saúde pública e a educação também poderiam ser destacados.  
             Contudo, esse fenômeno preocupante e que periodicamente recebe atenção midiática não é recente e, muito menos, pontual. Historicamente, as fronteiras configuram-se como lugares de incertezas e violência. Em regiões caracterizadas por desigualdades sociais, onde ocorre à confluência de limites internacionais de países estruturalmente distintos, as fronteiras tendem a ser exploradas economicamente através de mecanismos e estratégias ilegais. Devido a isso, elas possibilitam a coexistência de práticas modernas derivadas, em grande medida, da circulação de capitais e mercadorias, com práticas tradicionais muitas vezes radicalizadas, que aqui podem ser representadas pela exploração intensiva do trabalho e a formação de grupos de extermínio.  
            Buscando a promoção de um paralelo, a observação dos índices de homicídio nas outras fronteiras da América Latina permite afirmar que a estreita relação entre fronteira e violência não é exclusividade das cidades brasileiras. Levando em consideração as taxas levantadas em 2007 e 2008 sobre o número de homicídios em cada 100 mil habitantes, contatam-se similitudes entre as diferentes realidades. Para facilitar a visualização, os dados estão expostos na tabela abaixo.

Taxas de Homicídios em Algumas Fronteiras da América Latina
Fronteira
Ano
Número de Homicídios a cada 100 mil habitantes
México - EUA
2008
74
México - Guatemala
2008
23
México - Bélice
2008
48
Honduras - Nicarágua
2008
65
Venezuela - Colômbia
2008
34
Venezuela - Brasil
2008
40
Colômbia - Venezuela
2008
68
Colômbia – Brasil
2008
51
Colômbia - Panamá
2008
32
Equador – Colômbia
2008
35
Argentina - Brasil
2007
18
Argentina - Uruguai
2007
19
Chile - Peru
2007
6
Chile - Argentina
2007
8
Chile - Bolívia
2007
7
Fonte: Carrión & Espín (2011)

            A tabela apresenta de forma resumida os dados referentes apenas a algumas fronteiras do continente e os índices dizem respeito ao número de mortes ocorrido apenas de um lado da fronteira. Por exemplo, observa-se que na fronteira da Venezuela com a Colômbia foram mortas 34 pessoas a cada 100 mil habitantes e, do outro lado, na fronteira da Colômbia com a Venezuela foram 68. Outro aspecto a ser observado, é o impacto econômico. Os países politicamente mais estáveis e com a economia mais desenvolvida apresentam índices mais reduzidos de mortes.
            Isso permite afirmar que as fronteiras entre os países com melhores taxas de crescimento e de distribuição de riqueza tendem a possuir os índices mais baixos de homicídios. Neste sentido, observa-se que as fronteiras européias possuem freqüentemente taxas de homicídio muitas vezes abaixo de dois dígitos, sem falar que, muitas vezes, as divisas entre os países não possui nenhuma espécie de fiscalização. No Brasil, as taxas dos cinqüenta municípios mais violentos variam de 107,2 a 68 mortos a cada 100 mil habitantes, enquanto a média do país em 2006 foi de 26,2 homicídios.
            Tal situação expressa que o grande problema não é a fronteira, mas os níveis de desenvolvimento diferenciados existentes em uma mesma região. No mesmo sentido, as posturas jurídicas e tributárias diferenciadas existentes nos diferentes países do continente acabam permitindo a utilização da fronteira de maneira instrumental. Logo, a solução para os problemas não se encontra na radicalização da fiscalização, mas na construção de políticas de desenvolvimento comuns.  

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