Hoje apresentamos uma rápida conversa que tivemos com a diretora da Casa do Teatro Arinha Rocha, no dia 20 de Outubro deste ano. Em meio a tanta correria ela se dispôs a nos ceder algumas palavras sobre o importantíssimo trabalho realizado a alguns anos na região das três fronteiras. O grupo de artistas que se reúne em torno da “Casa do Teatro” existe há 20 anos. Ele surgiu com a criação da Companhia Foz de Teatro, a partir da ideia e a necessidade de se discutir arte e cultura por pessoas que tinham interesses, e posicionamentos em comum. Entretanto, somente há 08 anos a Casa do Teatro foi constituída como entidade, passando a desenvolver diversas atividades, principalmente de arte-educação. Atualmente, o grupo desenvolve diversas formas de expressão, como teatro, música, desenho, cultura hip hop, dança e literatura. Em grande medida, as atividades são desenvolvidas para crianças e adolescentes, de todas as partes das três fronteiras.
Como vocês observam a relação entre arte e política?
Toda a ação e relação social é uma forma de política. Logo, a arte não se diferencia disso. A arte é política por sua natureza, ela propõe sempre uma nova visão, uma nova estética, ela fala do mundo e o denuncia. Quando chamamos atenção para a arte, isso é uma ação política, mesmo os que pensam a arte como entretenimento, como um adorno, estão se posicionando. Até mesmo a arte que pretende ser neutra é política. Para nós a arte é libertadora, pois não podemos mais apenas consumir cultura: é preciso produzi-la. Não basta gozar arte: necessário é ser artista! Não basta produzir idéias: necessário é transformá-las em atos sociais, concretos e continuados.
“Não cabe à arte apontar soluções para os problemas sociais, mas incitar a reflexão e mostrar as contradições e os valores de uma sociedade”,
Com relação ao serviço prestado a crianças em risco, como se dá a relação de vocês com a vida pessoal e social dessas crianças?
Tentamos sempre dar um feedback entre os pais dessas crianças, se elas chegam na Casa do Teatro com algum problema que não seja possível de se resolver lá. Nestes casos, são os pais são avisados. Nós vamos a casa deles para tentar entender o que está acontecendo. Não podemos fazer muito. Mas quando a questão é a falta de diálogo, ajudamos muito.
E é claro que eles, depois de participarem de ações, também se sentem mais fortalecidos, entendem mais sua condição e tentam mudar, melhora a forma de ver a sociedade, tornam-se mais críticos. Isso pra mim é ajudá-los, dar novas ferramentas pra resolver os problemas.
Como é abordada por vocês a questão da violência, tanto física quanto psicológica?
Nós realizamos uma terapia chamada de “Rodas de Conversa”, que um método de diálogo, onde discutimos temas diversos. Sempre tentamos fazer com que as crianças e os adolescentes sugiram os temas, e o tema da violência é sempre muito retratado, pois para esses adolescentes e jovens a violência é muito próxima. Todos eles conhecem alguém que se envolveu com drogas, que já foi preso e que já foi violentado de alguma forma. Muitas vezes eles mesmos fazem peças narrando esses casos, e, a partir disso, criamos um diálogo sobre a questão. A partir disso encaminhamos para um psicólogo, caso seja ele a vitima ou oferecemos outros encaminhamentos, de acordo com a gravidade do caso.
Todos os membros da Casa do Teatro dedicam-se unicamente a ela?
Não. Além de participar de nossa entidade, as pessoas também estão inseridas em outros projetos. Temos um grupo bastante inserido na vida social da cidade.
A Casa do Teatro possui vínculo empregatício, ou são todos voluntários?
Os dois casos. Atualmente a casa possui 23 “funcionários-voluntários”. Chamamos assim porque essas pessoas recebem pouco e trabalham e produzem muito, com muita dedicação, amor e prazer naquilo que fazem.
Os integrantes desenvolvem alguma atividade política partidária?
Sim, eu e alguns da Casa. Tentamos sempre deixar a instituição fora desta discussão, porque são várias pessoas que a compõem, e são de diversos pensamentos. Eu sempre fui filiada a partido, porque acho que temos que nos organizar e uma das formas pode ser os partidos políticos. Então eu não vejo nenhum problema nisso. Aliás, eu acho que as Instituições sociais que se dizem neutras estão extremamente enganadas, porque primeiro, essa tal neutralidade não existe. Se você trabalha e acredita em algo, você tem que se posicionar, sempre. Tem pessoas lá na casa que são de outros partidos, tem gente que não tem partido nenhum, tem anarquista, tem louco de todo o tipo. A instituição tem uma missão, uma meta, e ela está ali pra resolver aquilo que ela se propôs a fazer, agora as pessoas são indivíduos. Isso você pode escrever de forma bem clara: A CASA DO TEATRO NÃO TEM DONO! NINGUEM MANDA NAS PESSOAS QUE ESTÃO LÁ. (risos).
Como a situação de vivenciar as fronteiras internacionais interfere ou atua no trabalho de vocês?
Diretamente. Vivemos essa mistura cultural. Temos um professor de música argentino, e a musica argentina faz parte de nossa vivência. Também temos muitos alunos paraguaios, tem árabes, indiano várias pessoas, de diversos lugares do mundo. Essa diversidade é a marca da comunidade da cidade. Tem o lado bom e o lado ruim de se viver estar na fronteira. Os problemas também são muito próximos de tudo que a gente faz, e tudo é retratado. Geralmente recebemos as influências artísticas dos dois países, de dois não, mas de todas as pessoas que vivem aqui.
Quanto aos países próximos, Paraguai e Argentina, existe uma influência cultural muito forte, as fronteiras existem somente geograficamente. As pessoas que produzem cultura trocam entre si, as bandas daqui geralmente falam em suas letras, coisas em guarani, espanhol. Há bandas aqui como “Nem Pelé, Nem Maradona”, que é a mistura de argentinos e brasileiros. Também tem um grupo de teatro, o "Vira Colchão" que são brasileiros e paraguaios que faz teatro com a gente. A nossa relação é muito próxima.
Qual a relação de vocês com o poder público?
Muito boa (risos).
A relação da Casa do Teatro (instituição) com o poder público é excelente, de parceria. Temos parceiros como a Itaipu, Ministério da Cultura e outros órgãos públicos. Mas é claro que como qualquer cidadão, também temos divergências (críticas) em relação a algumas de suas ações e esperamos nunca nos calarmos frente a injustiças ou desmandos.
Qual a relação de vocês com setor privado?
Muito boa (risos).
Com relação aos empresários, eu acho que a gente sempre pode contar com grande parte, temos amigos que sempre nos ajudaram, pessoas que fizeram em algum momento o material gráfico da Casa, de algum jeito apoiou uma iniciativa da gente, eu acho que é por aí. Sempre pontualmente.
Quais os projetos futuros?
O nome da Casa é projeto (risos). Eu espero que a gente consiga transformar os nossos projetos em ações. Nós temos muitas ideias e muita vontade, eu acho que estamos em um bom caminho, para construir algumas coisas que sempre sonhamos a construção da sede, que é o projeto mais difícil, por exemplo. Nós temos o terreno, ele foi repassado pela Prefeitura, você vê que o poder público tem contribuído. A sede própria é o nosso sonho mais difícil mesmo, porque é o mais caro. O terreno é próximo do “Teatro Barracão” e lá é um pouco mais distante do teatro, onde estamos atualmente. Mas nós sempre queríamos construir em um bairro, porque é onde nós estaremos mais próximos do nosso público. O lugar é ótimo onde planejamos construir é ótimo, entre o Campos do Iguaçu e o Libra. Outro projeto que irá acontecer já com data marcada é o “Fome de Cultura”. É uma iniciativa para fazer algumas reformas no Teatro Barracão. Estamos vendendo pizza, com a parceria do Muffato, e outros grupos da iniciativa privada. A nossa meta é vender duas mil pizzas, pra gente poder reformar o telhado e fazer outras melhorias no teatro, para a gente e a comunidade poder usá-lo de forma melhor.
As pessoas próximas à Casa do Teatro estão com bloquinhos da venda dessas pizzas. Ao comprar sua ficha, você terá dois dias, nos dias 12 e 13 de novembro para retirá-las, no Mercado Muffato Boyci. Os sabores das pizzas serão calabresa e mussarela. E você que também tem fome de Cultura pode contribuir.
Ps: Atualmente a Casa do Teatro está utilizando a estrutura do Teatro Barracão, emprestada pela Prefeitura de Foz do Iguaçu, a fim de que a instituição utilize este espaço físico para manter suas atividades, mediante um contrato com horários definidos. Nós arcamos algumas despesas para o funcionamento do local.